Nhara Sikidu – Textos Poéticos – Helena Neves Abrahamsson

Trata-se de textos poéticos que abordam não só aspetos políticos, sociais e culturais da Guiné-Bissau, mas, também, a autora partilha com o leitor um conjunto de palavras refletidas em poemas que lhe preenchem a alma, acalentando os sentimentos e os percursos da sua vida em vários momentos e espaços.
Ao longo do tempo a autora foi escrevinhando e declarando o amor à sua pátria, terra que a viu nascer (Nha Kasa…) que queria voltar a ver (…) quereria voltar a ter-te, viver em ti contigo, a vida que me resta, e as outras que vivi noutros mares (…) na memória guardo o teu cheiro suavemente percorro a ponta dos dedos pelas tuas curvas, bolanhas, mares e rios (…) sinto-te endurecer, crescer, vir e jorrar o sémen da esperança (…) desabrochar para o orgasmo da vida que te espera (…) tuas águas, teus mares, teus rios são o sémen que fecundam vidas, estas vidas adiadas mas que, um dia, serão vidas, vividas (…) Autora fala-nos de si, percorrendo os seus sonhos em que tudo acontece, presa nas telas da sua própria fantasia, mas dona de si mesma.
Ainda percorre os espaços e em devaneios (Kabesa Na Pupan) encontra o silencio que é permanente na esquina do bairro ao centro do lago onde há́ chamas reprimidas, sepultadas sem chão, nem tempo (…) Termina esta coletânea conversando em Kriol poético, Nhara Sikidu, Ramantchada, Sinhora di si nariz, Murtcha-murtchadu, Korçon na del, Pitu fitcha, larma lágua. Maltomadus, malvadus na kabalindadi, lebal si mar, si laguas, si blanhas, si floris di mkeklets. Aí, ki sunhos gora? Sunho di si guintis, Sunhus di si povo? Nhara Sikidu, korçon ratidja, larma lagua, na mar di kassabi (…)
Luís Barbosa Vicente, CEO Nimba Edições.

Ela a sente por dentro, latejando amores e dores. Sente-se o jorrar da esperança em torrentes quentes e rubras. Ela a faz saliente no exacto momento em que da caneta a sua alma no papel derrama. Sim, do lado esquerdo do peito, nasce a veia desta poetisa que em prosa e versos neste livro nos visita. Em 40 poemas e textos poéticos distribuídos por 4 momentos, encontram-se agrupadas as páginas deste livro.
Somos desde logo invadidos pela dor que a inquieta, dor de ver a terra-mãe minguar por entre os escombros da decepção e tristeza de uma nação independente, mas não livre! Um país onde não se ousa falar ou contrariar a ordem das coisas porque “Temos medo / Temos medo / Muito medo”. Somos forçados a olhar uma Guiné-Bissau onde o conformismo e a ganância fizeram moransa, onde as crianças “Estes que um dia foram FLORES, que um dia foram a razão das estrelas de fogo que rasgaram a aurora” morrem de barrigas vazias, sem experimentar a infância, à espera de um futuro que lhes foi prometido, mas tarda a chegar!
Somos testemunhas da frustração da poetisa “tornei-me noite escura inundada por um alvorecer / mil vezes adiado”, é nesse momento que nos esmaga a dura realidade de perceber que este país foi esquecido até por “Deus deitado de costas olhando para o teto do céu / interrogando-se se por cima desse mesmo tecto haverá outro céu e outro Deus”. Ela sente tão intensamente o que só o seu ser poético pode cantar em versos; “Tudo o que sei / Foi o que não vi / Sou simplesmente / o que senti / O que toquei / O que AMEI” e num monólogo entre Ami ku Mi ela consegue se olhar por dentro e se encontrar, pois, só sentindo se sabe a existir.
Entre o dever e o ser, o (des)amor que “sobrevive ao tempo, / aos ventos / e às marés.” Finalmente, é Na Kriol, língua que tanto ama que se vê capaz de exorcizar os “maus espíritos” dos vivos que teimam em nos atormentar; “Foras di nos na norostia / Na lagua lagua / Na tchiganta kurpu / Pa suflinu alma.” Apesar de tudo, apesar de “Maltomadus, malvadus (ku) suti sunhus di povo / na sé bolsos sussus, sin fundo”, por entre os destroços do sonho de uma Guiné-Bissau maior a tímida, mas persistente ESPERANÇA, a nossa mais antiga combatente, vagueia juntando os cacos desse futuro adiado, dizendo “Tempu di mindjeris di nha terra tchiga”. Urge agirmos “pa ka amanha torna bim kaplinu mas!”.
Aviso, o acto de folhear este livro não deve ser tomado como algo banal. Existem livros que nos oferecem algumas horas de evasão dos problemas do quotidiano, livros que nos permitem sair de nós mesmos e conhecer lugares para lá dos nossos horizontes. Esses são os livros que nos tocam, mas existem aqueles que nos inquietam, nos desafiam a tomar uma atitude relativamente ao que nos rodeia e esses são os que nos TRANSFORMAM!
O livro Fora Di Nos nos permite essa viagem da qual vos garanto, ninguém volta igual!
Excerto de Prefário de Rita Ié, Socióloga, março de 2021

BIOGRAFIA
Helena Neves nasceu na Guiné, na cidade de Bissau, em 1962. É formada em Direito pela Faculdade de Direito de Lisboa. Trabalhou como advogada e durante toda a sua vida na área dos direitos humanos, particularmente em questões de desenvolvimento, género, mulher e criança, em vários países, nomeadamente Guiné-Bissau e sub-região da África Ocidental, Angola e Suécia.
Continua a trabalhar ativamente com os direitos humanos exercendo um ativismo social ativo. Também dedica uma boa parte do tempo à arte. Fez vários cursos em escolas de arte na Suécia e dedica-se em particular à arte da pintura em tecido e tela.
A publicação de um livro é algo novo para a autora sendo este conjunto de textos poéticos o seu primeiro trabalho organizado.
O livro já está disponível. As encomendas podem ser feitas através de e-mail: nimba.edicoes@gmail.com

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